A poesia não precisa de ser útil. É no valor imenso da sua inutilidade que se fixa a sua importância. As imagens que possa oferecer ―como quem diz, o dia que se inicia com jogos malabares de pedras, corações-calhaus a dançar no ar que a ninguém alcançam, a ninguém ferem, ninguém é ninguém que passa, o chão que os recebe, prontos para mais um amanhã: a circular persistência do sonho inatingível― podem ser uma verdade qualquer, e a verdade tem frases assim que tocam (música).
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projecto de vida
de manhã
jogo calhaus ao ar e
faço o cômputo das pedras
que não ferem nenhum passante
os passantes não passam
as pedras estão no chão e
os calhaus cairam todos
novamente
Ana Saraiva. 19 de dezembro de 2010
(Versão para português de María Alonso Seisdedos)
19 comentários:
E qual era a utilidade da poesia se tivesse de ser útil? Poesia é terra de sonho e devaneio... que nem sempre entendo. Dá-me vontade de voltar à idade dos porquês! ;)
Beijo!
Se os calhaus forem muito grandes, as coisas não são bem assim. Podem provocar um terramoto.
A poesia é como uma pintura, Teté, ou como um vinho. Ou como...
Pois, Anónimo. Mas a terra está sempre em movimento, e os calhaus e nós com ela.
Por isso é que eu vivo no hemisfério Sul, para não levar com os calhaus!...
Fico com o tango: não tem calhaus.
;)
Ah, um bom lugar o hemisfério Sul, Anónimo, onde tudo o que cai, diz-que, cai para o céu, e o que voa, voa ao inferno.
Compreendo, Jonasito. Sempre preferiste dançar a mastigar calhaus. ;)
Por um segundo apenas, que não levei com um calhau!
Os meus calhaus são tão inúteis e exactos, Anónimo, que por um segundo sempre erram.
Passo para lhe desejar um Feliz Natal e excelente 2011, cara amiga.
Dia 23, se puder, passe lá pelo CR.
Farei um espaço na minha intensíssima agenda, Carlos. ;)
Totalmente de acordo: normalmente as cousas máis belas son tamén as máis inútiles.
Otra cousa é que as cousas inútiles sexan tamén belas, pero iso é outro cantar.
Esquecíame: e cando a poesía tentou ser útil (ideoloxicamente, por exemplo) deixou de ser bela e até deixou de ser poesía.
Vaia, para unha cousa que, pensei, servía para algo...
A poesía é o que ten: mesmo na súa inutilidade hai maxia e fermosura.
Home, Kaplan, eu non quería dicir tanto, nin tan pouco. E tamén non concordo co segundo comentario, ese da utilidade e a ideoloxía e a preciosidade ou o valor. E aposto a cabeza a que vostede tampouco pensa así, se escavicha un chisco.
Condadito, que xa nos coñecemos dabondo para sabermos que nada é o que parece. A poesía serve para moitas cousas, só que son cousas inútiles. ;)
O que ten e o que non ten, Raposo, a poesía ten. ;)
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