quinta-feira, 25 de setembro de 2008
A velha polaca. Capítulo V
Enquanto Ludmila Bukovski limpava sem fingimentos a mão direita de imaginárias babas e suores ―dos que presuntamente lha impregnara o louvaminheiro do senhor doutor Segismundo― com um pano bordado de seda que deixou cair na lixeira ao pé do balcão, o Tisco entretinha-se em cheirar no vaso do ficus, à procura do melhor ângulo para aliviar a bexiga de toda uma noite de contenção. Estando atarefada a Jennifer, como era de costume, em atender o telefone num sussurrar que não dava para ocultar o tom erótico da conversa, o Eustáquio recebeu a velha polaca com todos os dentes que lhe cabiam na queixada à vista. Na porta, petrificado, o senhor doutor Segismundo abanava a cabeça do balcão ao ficus, sem maliciar que naquele preciso instante a sua melhor cliente transferia ao banco dum paraíso fiscal e turístico os fundos da conta que durante décadas figurara ao nome do casal e cuja potestade o dia anterior um juiz, instado pelas autoridades sanitárias competentes e mercê dos ofícios dum advogado sem escrúpulos, acabava de conceder à futura viúva. Não satisfeito, o Tisco, visto que a operação demorava, decidiu descarregar o peso que lhe confrangia o ventre, discretamente, encolhendo o corpo, numa atitude indefesa que naquelas circunstâncias sempre o impelia por instinto a encostar-se a um canto. À Jennifer o fedor que invadiu de repente a sala ceifou-lhe a inspiração, e ao encaminhar para o corpo do delito (ou vice-versa) os olhos, cruzaram-se-lhe com o aceno entre suplicante e imperativo do director, que a instava a reparar o desastre ipso facto de esfregona na mão, enquanto o cão arranhava nos ladrilhos com os quartos traseiros como se quiser soterrar o assunto.
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6 comentários:
Hummm... esta velha polaca está bem portuguesa no meio e no fim, no início está apenas aportuguesada!
Ou, eventualmente, não conheço esse léxico, que pode ser nortenho.
Dá para entender, note-se! (não acredites sempre que te dizem que "não percebo patavina") (`_^)
Hmm, Teté, vais-me ter de elucidar. Para mim isto de traduzir ao português está a constituir um desafio muito complicado. Sempre tenho medo de errar. Se é problema de léxico, ainda bem, tenho mais medo é da sintaxe.
Dá uma ajudita, vá lá, sé boazinha. Diz que palavras não percebes. Acho que sei quais são, precisamente porque escolhi algumas que são também galegas, mas não podo estar a adivinhar: se me enganasse ainda piorava a coisa.
Bom, lá tive que ir ao dicionário e encontrei duas que não conhecia, embora se percebam pelo sentido: babugem (baba) e fariscar (farejar).
As que não existem mesmo (pelo menos no meu dicionário, que já é de 1990/1991) é presuntamente (que suponho querer dizer presumivelmente ou presuntivamente) e bisbilhar (será bisbilhotar/coscuvilhar?)
Suponho que também seria mais correcto escrever: "encaminhar-se para o corpo do delito", mas isso já é mais complicado de explicar, além de que a parte gramatical do português nunca foi o meu forte.
Tomara eu errar como tu, a escrever espanhol... (*_*)
Beijoca!
A velha polaca vou juntar em capítulos e ler no fim de semana :)
Obrigada, Teté. Acho que vou ter de fazer alterações. Sempre que observares erros, se quiseres e tens paciência, podes corrigir.
(Vou ver é se encontro alguém aqui por perto para me dar aulas de português. É a única maneira de ir avançando.)
Tá-se bem!, isso mesmo fizeram por aqui alguns visitantes com a versão galega: imprimiam e depois liam com calma. Depois, sempre podes fazer pedacinhos e adicionar à caixa de areia dos gatos. (^_^)
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