O telefone não parava de tocar. Desde que decidira acrescentar um complemento ao ordenado anunciando-se nas páginas de contactos para compensar a miséria que lhe pagavam no banco quase nem fazia mais nada. Às vezes, não negava, excitava-se, mas era um trabalho limpo —limpo, digo?, impoluto— e tentava não se implicar desnecessariamente com a clientela.
—Oláaaa...? —atendia, prolongando a vogal num decrescente interrogante de voz grave e cálida.
Do outro lado a variedade imperava. Também não impusera condições, tanto lhe fazia peixe como carne, enquanto a relação fosse meramente oral. O seu nome de guerra era Aser, que satisfazia todo o mundo, pois o mesmo evocava uma víbora de vertiginosos saltos e decote infinito, um magno general de armas rendido, um sedutor maduro delicado e afável, um tigre bengali de exotismo voraz.
Filho bravo dum banqueiro lisboeta, aproveitou a mensalidade generosa que este lhe depositava a fim de evitar um desagradável —em muitos sentidos— exame de ADN para sufragar os estudos de Económicas sem sobressaltos, e terminou o curso com um currículo nada desprezível. Depois, o próprio pai encarregou-se de lhe procurar o estágio pertinente na sucursal portuense na que despregava todos os seus encantos para seduzir num agora-cedo-agora-puxo deliberado o director, não só porque gozava com aquele lambe-cus tirânico dominado, mas porque era um passo crucial nas referências que lhe procurariam um contrato digno.
—Puta que pariu o cão! —abafou cobrindo por instinto o micro do telefone com os dedos, enquanto trocava um sorriso lúbrico com o doutor Segismundo, que já despossuído de mando mas crédulo convicto no seu papel de chefe e macho, o cominava a livrar o encerado mármore florentino do opróbrio.
6 comentários:
Não notei nenhum erro de português, mas perdi-me um bocado: quem é que atende o telefone e dá pelo nome de Aser? (sorry, mas perguntar não ofende, né?) (`_´)
Estás é a perder o fio da história, Teté. É a "menina" Jennifer. Se vais à versão galega, no C. VI (tens aí à direita um link), tem ali um comentário do Jonas muito elucidativo. (`_^)
Ah, e dás-me uma alegria se não há erros. Obrigada.
Ah, bom, afinal a dúvida era igual à do Jonas... não tinha a certeza de ter entendido bem! (`_´)
Não disse que não havia erros, disse que não tinha reparado em nenhum, o que é uma diferença abismal! Mas podes ficar contente à mesma, que tenho tendência para os notar logo... :)
Os dos outros, porque os meus, pois... (e no caso só estou a falar de escrita, ok?)
Mas se tu não reparaste, Teté, que foste quem leu e confio no teu critério, que interessa se houver ou não? (`_^)
Não foi só tua a dúvida, mas foi propositado não mencionar o nome, assim obrigo a entrar cá a perguntar...
Beijinho
Não há erros nenhuns, sun, escreves português muito melhor que muitos portugueses, isso te garanto eu. O teu portugues é uma delícia. A sério! :)
Obrigada, Van. A sério, dá-me muito trabalho e sempre estou com inseguridade quando traduzo para português. Por isso agradeço que me digam se cometo algum erro: é a única maneira de aprender.
Beijinho
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