sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Sobre a ignorância constroem-se poemas


Depois há quem diga, ai, e que tal, a doença fez-me melhor. Não, digo, a doença não fez nada ou faz, faz a gente mais lúcida, mais atenta ao espaço, às horas, aos gestos. A doença faz crescer dentes na alma e papilas gustativas nas plantas desarraigadas dos pés (também, por acaso, muitas nano-línguas nas retinas).



Nisto haverá discrepâncias. E eu talvez esteja errada, com certeza, não tenho dúvidas. Tenho é dias (e as suas noites, como se verá), mas bondades nenhumas. Ainda não compreendi porquê aprecio o olhar fundo dos meus cães e o pêlo, diferentes em cada um deles. De maneira simples, é só que...

Ando de coração quebrando-se-zinho, o peito em labaredas, as noites mal-dormidas (pois, nada novo). De aí. E receio ainda dos exames médicos. Se disserem, quando tiverem de dizer de aqui a uns tempos, minha senhora, isto afinal são gases, lá vai o lirismo (e a tragédia) por água abaixo.

16 comentários:

Kapikua disse...

O que nos trás a doença?

a vontade de aproveitar cada momento que nos resta?
O descobrir da beleza de coisas que nunca reparamos belas?

beijo meu

Sun Iou Miou disse...

Tch, tch, tch, Kapik: estás muito enganado, a doença não "trás" nada. Traz, meu amigo, traz! (Sou má, eu sei.)

Beijo doente!

Rafeiro Perfumado disse...

Isso seria excelente, veres a angústia terminar num clamoroso fogo-de-artifício rectal! E convém não fumares nesse dia...

Beijoca e abracinho!

Sun Iou Miou disse...

Ai, Raf, até poderia ser estereofónico. Coitados médicos, às vezes.

Abracinho dentro das (des)medidas orçamentais!

Anónimo disse...

Serán gases. Non todo han ser lirismos, carallo. E menos nun cabaré... ;))

Beijos (atrasados).

Sun Iou Miou disse...

Ala, xa pode descansar, setesoles. Respire fundo e que non lle vaia o ar por mal camiño, que logo xa sabe.

Ai, é que isto non é un Cabaré!!!

Kapikua disse...

tens razão Sun Iou...

mas se dizerem? ou será se disserem?

Sun Iou Miou disse...

Hehehe! Kapik! E pimba! (Mas eu vou corrigir já!)

Teté disse...

Pois eu acho que a doença faz alguma coisa, sim. Não falo por mim, porque felizmente até hoje nunca tive nenhuma grave. Mas conheço pessoas que perante uma doença (e não estou a falar de maleitas) tomam consciência que o fim pode estar perto - e essa consciência (ou lucidez) faz com que sejam mais tolerantes, menos preocupadas com trivialidades. Por vezes aproveitando cada minuto, quando se deixaram arrastar anos a fio em completa inércia...

Não serão todos, é certo, cada caso é um caso, que os comportamentos humanos não são aferidos por bitolas. Também há quem se feche ao mundo, num mutismo surdo e temeroso. E quem finja que não está nem aí. Sei lá...

Gerir o medo desses relatórios médicos parece-me o mais difícil. Mas tomara que digam que são só gases! Antes perder em tragédia e ganhar em comédia... :)

Beijoquitas e bom fimde!

pau disse...

Pois, bemvindos sejam os gases que trazem tanto lirismo!

Chousa da Alcandra disse...

Non e cortes un pelo en deixalos sair (os gases), que un blogue tamén ten que servir para iso!.
E digo o mesmo que setesoles. Incluido o imperativo carallo!

Sun Iou Miou disse...

Mas isso, Teté, nem sempre nos faz melhores. Mais atentos sim.

Sun Iou Miou disse...

Pau, serão gases nobres?

Sun Iou Miou disse...

Está visto, Chousa, que son malos tempos para a lírica.

xenevra disse...

recordoume aquel fermoso conto do Castelao,o da condesiña, que afinal morrera dunha enchenta de cereixas e non de amores. "Hai homes/médicos que non saben calar!!!"
bjs

Sun Iou Miou disse...

Essa da enchenta de cereixas aínda me pode pasar a min, Xenevra.

(Tiña que ser Castelao.)